quarta-feira, 18 de abril de 2018

Seis fatos sobre terapia hormonal com hormônios ditos bioidênticos em mulheres

A terapia hormonal tem diversos usos dentro da Medicina. Em mulheres, a reposição hormonal está indicada especialmente para tratamento dos fogachos que surgem perto da menopausa. O interesse por terapias alternativas, especialmente a feita com hormônios ditos "bioidênticos", cresceu bastante nos últimos anos. A busca por tratamentos "mais naturais" e o intenso trabalho de marketing explicam esse fenômeno. Mas será uma opção superior à convencional? Vamos aos fatos...




1- Hormônios ditos bioidênticos são iguais aos hormônios convencionais.
A indústria farmacêutica produz hormônios modificando quimicamente extratos de plantas, especialmente soja, para criar moléculas idênticas às do nosso organismo. Isso vale tanto para as preparações comerciais quanto para os bioidênticos. A indústria que produz ambos é a mesma. A única diferença é que o termo "bioidêntico" costuma ser usado para preparações feitas por farmácias de manipulação.

2- Os bioidênticos apresentam menor pureza.
Na prática, as doses referidas nas prescrições costumam ser bastante diferentes das doses presentes nos produtos. Segundo o FDA, órgão equivalente a ANVISA nos Estados Unidos, as potências variam de 67,5 a 268 por cento do referido no rótulo ou na prescrição (1). Além disso, a absorção da moléculas costuma ser menor quando comparada ao tratamento convencional. Em outras palavras, o risco de dosagem abaixo ou acima da recomendada é muito alto, especialmente nas formas que não permitem ajuste da posologia, caso dos implantes (figura).

3- Implantes hormonais não são para todo mundo.
A terapia de reposição hormonal tem indicações muito precisas (sintomas como fogachos e disfunção sexual em mulheres no período perimenopausa, por exemplo). Implantes hormonais jamais devem ser prescritos com a intenção de melhorar vitalidade, sensação de energia ou aparência física. Mulheres jovens tendem a ser um grupo de maior risco. O uso de testosterona e a liberação hormonal errática do implante podem levar a efeitos deletérios na função reprodutiva, isto é, podem diminuir a fertilidade.

4- O tratamento com bioidênticos custa caro.
Apesar de algumas formulações custarem menos que algumas apresentações comerciais, o custo do tratamento com bioidênticos costuma ser muito maior por dois motivos: solicitação de muitos exames desnecessários na tentativa de monitorar a terapia; alto custo da consulta dos profissionais prescritores, devido ao risco que assumem ao indicar tratamento sem comprovação científica.

5- Não existem dados sobre a segurança da terapia com bioidênticos.
Ausência de estudos evidenciando risco não significa que o tratamento seja seguro. Significa apenas que os dados não foram devidamente avaliados ou estão sendo omitidos. Não dá pra dizer que o uso de bioidênticos não aumenta o risco de câncer de mama ou de trombose, sem que bons estudos tenham sido feitos. Todo tratamento precisa ter seu perfil de segurança devidamente estudado antes de ser amplamente prescrito. É dessa forma que conhecemos os possíveis efeitos adversos, quem está mais propenso a apresentá-los e, principalmente, como devemos agir caso apareçam.

6- O uso de bioidênticos não é recomendado por sociedades médicas sérias.
Sociedade médicas internacionais (North American Menopause Society, American College of Obstetricians and Gynecologists e Endocrine Society) e a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) não recomendam tratamento com bioidênticos por entenderem que os riscos são maiores que os benefícios. 

Referências:
1- US Food and Drug Administration. Bio-identicals: Sorting myths from facts http://www.fda.gov/Drugs/GuidanceComplianceRegulatoryInformation/PharmacyCompounding/ucm049311.htm (Accessed on November 20, 2012).
2-  Martin KA, Barbieri RL. Treatment of menopausal symptoms with hormone therapy. UpToDate.

Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Doutor em Endocrinologia
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

terça-feira, 3 de abril de 2018

Doença renal não causada pelo diabetes em pacientes diabéticos

"Nem tudo que reluz é ouro", diz o ditado. Isso também vale para doença renal em pacientes com diabetes mellitus. A nefropatia diabética - doença que ataca os rins de indivíduos diabéticos - é uma das complicações microvasculares mais frequentes e temidas.  O problema pode atingir até cerca de 30 por cento dos pacientes. Seu aparecimento depende de fatores como o tipo de diabetes, duração da doença, genética, controle das taxas glicemia e de pressão arterial.



Quando o endocrinologista atende um paciente com mau funcionamento dos rins, o mais provável é que o diabetes tenha causado o problema. No entanto, existem casos onde outras doenças podem ser culpadas. Os seguintes achados clínicos levantam essa suspeita:
- perda de proteína na urina nos primeiros 5 anos de diagnóstico, no diabetes tipo 1.
- início súbito de doença renal, já que a nefropatia diabética é caracterizada por ser lentamente progressiva, evoluindo no decorrer de anos.
- perda de células sanguíneas através dos rins. Isso é verificado através do exame comum de urina ou EQU. Quando o glomérulo, estrutura que filtra o sangue dentro dos rins, está doente, as hemácias - células vermelhas do sangue - podem ser indevidamente filtradas e parecer no formato de estruturas chamadas de cilindros ou acantócitos na urina.
- ausência de doença na retina em pacientes com diabetes tipo 1. Ora, se os vasos snaguineos do fundo do olho também são pequenos, espera-se que a doença microvascular acomenta ao mesmo tempo tanto a retina quanto os rins.
- sinais e sintomas de outras doenças como lupus, púpura, mieloma, hepatite C, entre outras.
- queda brusca na taxa de filtração dos rins (mais que 30 por cento em 3 meses) quando se inicia inibidores da ECA ou ARA II, medicamentos utilizados na proteção renal. Essa queda abrupta, sugere diagnóstico de nefroesclerose ou de estreitamento das artérias renais, especialmente em pacientes idosos com diabetes tipo 2.
Nesses casos, a avaliação do nefrologista é muito importante e tem como objetivo tentar diagnosticar, em até 38 por cento dos casos (1), outras doenças renais que possam ter manejo diferente.

Referências:
1- Mazzucco G, Bertani T, Fortunato M, Bernardi M, Leutner M, Boldorini R, Monga G. Different patterns of renal damage in type 2 diabetes mellitus: a multicentric study on 393 biopsies. Am J Kidney Dis. 2002;39(4):713.
2-  Bakris GL. Overview of diabetic nephropathy. UpToDate.


Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Doutor em Endocrinologia
CREMERS 30.576 - RQE 22.991