terça-feira, 26 de setembro de 2017

Como baixar os triglicerídeos

Apesar de ser um problema frequente na prática médica, ainda existem dúvidas sobre qual seria a melhor maneira de manejar a elevação dos níveis de triglicerídeos, ou hipertrigliceridemia. Quando as evidências sobre uma terapia não são definitivas, é sensato se optar pelo tratamento com melhor relação risco/benefício. No caso da hipertrigliceridemia, especialmente em níveis menores que 500 mg/dL, a mudança no estilo de vida ganha destaque.



Algumas vezes a elevação nos níveis de triglicerídeos tem uma causa evidente. Doenças como obesidade, diabetes, hipotireoidismo e síndrome nefrótica podem ser identificas através de avaliação clínica simples e devem ser adequadamente tratadas. Alguns medicamentos usados para os mais diversos problemas de saúde também podem causar hipertrigliceridemia. Estrógenos, especialmente por via oral, tamoxifeno, betabloqueadores, corticoides, ciclosporina, retinoides e medicação para o HIV também podem estar por trás do problema.
Se o manejo das causas da hipertrigliceridemia é insuficiente ou impossível, o próximo passo é procurar modificar o estilo de vida. A redução do peso e atividades físicas regulares são metas a serem alcançadas, já que o tecido adiposo é um grande reservatório de triglicerídeos e os exercícios ajudam a queimar esse excesso de energia.
Com relação a alimentação, quando os níveis são menores que 500 mg/dL, comer menos com o objetivo de baixar o peso, além de reduzir carboidratos com alto índice glicêmico ou alto teor de frutose (açúcar, pão branco, massas, arroz branco, doces, refrigerantes e sucos), ajuda na redução triglicerídeos. Aumentar o consumo de alimentos ricos em ômega 3 (peixes como salmão, sardinha, atum e frutos do mar) também é importante.
Quando os níveis de triglicerídeos são maiores que 500 mg/dL, o processamento da gordura proveniente da dieta (quilomícrons) fica prejudicado, logo, está indicada a redução na ingestão de gorduras (mesmo boas) para menos de 25 a 40 gramas por dia devido ao risco elevado de pancreatite, complicação potencialmente fatal. O consumo de álcool também deve ser desencorajado.
Se após todos esses cuidados os níveis de triglicerídeos continuarem muito elevados, o tratamento medicamentoso com fibratos poderá ser indicado.

Fonte: Hypertriglyceridemia - UpToDate

Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Doutor em Endocrinologia
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

terça-feira, 19 de setembro de 2017

Vale a pena usar hormônios ditos “bioidênticos”?

Alguns conceitos básicos de como funciona o sistema capitalista podem nos ajudar a entender melhor a “questão dos hormônios bioidênticos”. Imagine que você queira entrar no extremamente concorrido mercado farmacêutico. Seu capital inicial é pequeno tanto para produção quanto para desenvolvimento de novas moléculas. Com pouco dinheiro, é mais sensato investir em substâncias consagradas e que não sejam protegidas por patentes. Espertamente você escolhe alguns hormônios esteroides, o estradiol e a testosterona. Porém, substâncias pouco inovadoras costumam ser amplamente comercializadas por mais de uma empresa. Quando a oferta de um produto é ampla, seu preço despenca. Mas você não está disposto a ganhar pouco. Como diferenciar seus produtos dos demais? Marketing! E pior, marketing não ético! Estratégia infelizmente muito comum em diversos ramos no mercado…



O termo “hormônio bioidêntico” é uma jogada de markentig! Essa expressão foi cunhada para soar de forma mais suave que “quimicamente biossimilar” ou “quimicamente idêntico” ao hormônio encontrado na natureza ou que circula no nosso organismo. A geração das pessoas nascidas nas décadas de 1960 e 1970, também conhecidas como “geração granola”, tende a interpretar que coisas ditas “naturais” são boas e coisas ditas “sintéticas” são más. Muitas mulheres dessa geração estão agora enfrentando algum sintoma do período perimenopausa. Conhecendo o potencial mercado consumidor, fica fácil de entender a sacada do “hormônio bioidêntico que é mais natural, igualzinho ao que circula no meu organismo”, não é?
Mas não se engane! Os hormônios ditos “bioidênticos”, representados principalmente por esteroides (estradiol, testosterona, DHEA, progesterona e mesmo a vitamina D), são produzidos pela mesma indústria farmacêutica que fabrica os hormônios convencionais. Aliás, no mundo todo, devem existir apenas 6 ou 7 empresas capazes de produzir estes tipos de substâncias em grande quantidade dentro de um padrão de qualidade minimamente aceitável.
Mas se o hormônio convencional também é igualzinho ao que nosso corpo produz (salvo algumas exceções como os estrógenos conjugados), porque os endocrinologistas se preocupam tanto com os “hormônios bioidênticos”? Por um motivo muito importante: segurança.
Quando compramos qualquer medicamento em uma farmácia, ao abrirmos a caixinha, encontramos uma bula. A bula é um documento importante. Nela estão contidas indicações, doses, interações e perfil de efeitos adversos daquela substância. Para possuir uma bula, o medicamento precisa ter passado por estudos clínicos e estar devidamente registrado nas agências regulatórias, no caso do Brasil, a ANVISA. O problema é que os “hormônios bioidênticos” costumam ser manipulados ou colocados em implantes. A manipulação de uma substância por si só não é o problema. O problema é a prescrição de doses e combinações não avaliadas em estudos clínicos, isto é, com perfil de segurança desconhecido, ou pior, já avaliadas nos mesmos estudos e com perfil de segurança deletério.
A “moda dos bioidênticos” não é coisa nova. Outros países, especialmente os Estados Unidos através do FDA, sua agência regulatória, têm se mostrado preocupados com os possíveis riscos associados ao seu uso. A forma mais apropriada de garantir um tratamento seguro, barato e “natural” ainda é procurando profissionais sérios e com amplo conhecimento. As modas passam, mas complicações de tratamentos indevidos podem ficar pra sempre…

Fonte: Bioidentical Hormone Therapy: Whats Is It, Might It Have Advantages? - Medscape

Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Doutor em Endocrinologia
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

domingo, 10 de setembro de 2017

Sintomas compressivos causado pelo aumento da tireoide

Nossa tireoide tem entre 7 e 10 mililitros de volume e entre 10 e 20 gramas de peso. Está localizada logo abaixo da laringe (pomo-de-adão), sobre a traqueia. Lateralmente à tireoide, em ambos os lados do pescoço, localizam-se vasos importantes para a circulação do sangue na cabeça (carótidas e jugulares), além de alguns nervos (laríngeo recorrente e frênico). Todas essas estruturas são recobertas apenas por alguns músculos bem finos, pele e tecido subcutâneo. O conhecimento desta anatomia é importante para sabermos como o crescimento anormal desta glândula, ou bócio, é capaz de causar sintomas por compressão.



Os bócios podem ter diversas causas. Em países suficientes de iodo como o Brasil, a tireoidite crônica autoimune (Hashimoto), o bócio difuso tóxico (doença de Graves) e os nódulos são as principais. Nos dois primeiros casos, os sintomas de hipo ou hipertireoidismo costumam ser evidentes. Já os bócios nodulares, em grande parte das vezes, são assintomáticos.
A ausência de sintomas é explicada pelo crescimento lento da tireoide ao longo de anos ou décadas. Muitos pacientes nem desconfiam do bócio até que ele seja detectado através do exame físico ou de algum exame de imagem. Grande parte dos pacientes com tireoides muito aumentadas, que chegam a literalmente "mergulhar do pescoço para dentro do tórax" (bócio retroesternal), tem entre 50 e 60 anos de idade.
Indivíduos com bócios volumosos de longa duração podem desenvolver sintomas de obstrução devido à compressão progressiva da traqueia ou ao aumento súbito, geralmente acompanhado por dor, secundário ao sangramento dentro de um nódulo.
O sintoma compressivo mais comum é a falta de ar aos esforços. Este sintoma usualmente ocorre quando o diâmetro da traqueia fica menor de 8 milímetros. Em alguns pacientes com bócios retroesternais, a falta de ar costuma ser noturna e desencadeada por posições que forçam a tireoide da região cervical para dentro do tórax, como erguer os braços acima da cabeça, por exemplo. Quando a compressão da traqueia se agrava (diâmetro menor que 5 milímetros), o paciente pode começar a apresentar chiado mesmo em repouso, como se fosse asmático. Tosse também pode ocorrer entre 10 e 30 por cento do casos, assim como sensação de engasgo.
Outros sintomas que podem fazer parte do quadro são:
- ronco e apneia do sono: sintomas que melhoram em 29 por cento dos casos após a cirurgia.
- dificuldade em engolir (disfagia): sintoma pouco comum, já que o esôfago está localizado atrás da traqueia.
- paralisa do nervo laríngeo recorrente ou frênico: o que pode causar rouquidão ou soluços.
- compressão dos vasos sanguíneos do pescoço: complicações potencialmente graves, mas, felizmente, raras.
Apesar da maioria dos bócios causadores de sintomas compressivos ser benigna, a cirurgia costuma ser indicada após uma avaliação pré-operatória que inclui ecografia com punção dos nódulos suspeitos de malignidade, tomografia computadorizada, avaliação da função pulmonar e exames laboratoriais.

Fonte: Clinical presentation and evaluation of goiter in adults - UpToDate Online

Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Doutor em Endocrinologia
CREMERS 30.576 - RQE 22.991