domingo, 18 de junho de 2017

Microbiota e saúde metabólica

Estima-se que existam mais de 100 bilhões de galáxias no Universo... Não estamos sós! Esta afirmação ganha conotação ainda mais relevante quando consideramos todos os microrganismos que “moram” dentro do nosso aparelho digestivo. São cerca de 100 trilhões de seres microscópicos, predominantemente bactérias, que exercem diversas funções importantes, entre elas, regular nosso metabolismo.



O entendimento de que o microbiota intestinal possa exercer papel metabólico importante é relativamente recente. No ano de 2004, pesquisadores perceberam que ratinhos “livres de germes”, isto é, sem bactérias no interior do tubo digestivo, não engordavam quando alimentados com uma dieta rica em açúcar e gorduras. Além disso, quando esses animais eram transplantados com os microrganismos do intestino de animais obesos, acabavam engordando também. Em outras palavras, percebeu-se que os micróbios que habitam o trato gastrointestinal, de alguma forma, propiciavam a uma maior absorção da energia ingerida com os alimentos.
De fato, o nosso microbiota exerce esta e outras funções importantes desde que nascemos e começamos a nos alimentar. Do ponto de vista metabólico, quatro funções são essenciais:

1- Regulação da barreira da mucosa intestinal: o nosso sistema digestivo deve absorver nutrientes e barras substâncias tóxicas. Para que isso ocorra, as células que compõem a mucosa intestinal são fortemente ligadas umas às outras, o que evita qualquer tipo de “vazamento”. Uma das formas do microbiota ajudar nessa função é, literalmente, alimentando as células intestinais. Os microrganismos transformam as fibras da dieta em ácidos graxos de cadeia curta, o principal combustível das células da mucosa intestinal.

2- Controle da captação e da metabolização de nutrientes: dependendo da composição da nossa dieta, a composição do microbiota pode mudar, assim como a forma como aproveita determinados nutrientes. Dependendo de como ocorrer a metabolização de fibras, aminoácidos e sais biliares, a permeabilidade da mucosa intestinal muda, predispondo a maior inflamação, aumento no ganho de gordura e predisposição a distúrbios metabólicos como diabetes, hipertensão e dislipidemia.

3- Modulação do sistema imunológico: ensinar as células do nosso sistema de defesa a se comportar de forma apropriada também é função do microbiota. Os leucócitos devem aprender a identificar e combater as ameaças reais, ao mesmo tempo que evita respostas inapropriadas ou desnecessárias. Diversas doenças ditas autoimunes, como o próprio diabetes mellitus tipo 1, podem ter origem em desbalanços no sistema imunológico.

4- Prevenção da propagação de patógenos: já ouviu aquele ditado “quando os gatos saem os ratos fazem a festa”? A presença de um microbiota saudável evita a proliferação de germes com potencial de causar doenças.

Quando ocorre algum tipo de desbalanço entre as diferentes espécies de micróbios que compõem nossos microbiota, as quatro funções acima ficam prejudicadas. Chamamos essa situação de disbiose. Ainda não está completamente claro o mecanismo que leva à disbiose. No entanto, já se identificaram diferentes influenciadores do microbiota como a via de parto, características genéticas do hospedeiro, exposição a infecções e antibióticos e, principalmente a dieta.
A melhor compreensão da relação que mantemos com as bactérias do nosso intestino, além de esclarecer mecanismos ainda obscuros de algumas doenças, também tem o potencial de ajudar no desenvolvimento de novas modalidades terapêuticas. Assim como no que se refere ao conhecimento do Universo, estamos apenas dando os primeiros passos na exploração desses “microcosmo”…

Fonte: Boulangé CL, Neves AL, Chilloux J, Nicholson JK, Dumas ME. Impact of the gut microbiota on inflammation, obesity, and metabolic disease. Genome Medicine 2016;8:42.

Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

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