domingo, 13 de dezembro de 2015

Fadiga adrenal: cuidado para não receber o diagnóstico de uma doença falsa

Entre os sintomas mais comuns nos dias de hoje estão a fadiga e o estresse. Quando percebe-se que os níveis de energia estão baixos, as pessoas buscam por respostas e soluções. Algumas procuram por uma “bala mágica” e acreditam que o complexo vitamínico correto será capaz de restabelecer o vigor. Outras querem saber se existem medicamentos ou estimulantes para tratar o quadro. A verdade é que a avaliação de sintomas vagos pode ser um verdadeiro desafio. Muitos de nós temos vidas movimentadas, que por vezes não nos permitem praticar exercícios ou mesmo dormir de forma adequada. A alimentação também acaba prejudicada pela falta de tempo e pela conveniência. A fadiga e o estresse podem fazer parte da vida, mas também podem ser sintomas de doenças mais graves. É justamente o fato de serem sintomas inespecíficos que tornam sua avaliação e tratamento, algumas vezes, não tão fáceis.
Para alguns defensores de “práticas alternativas”, esses sintomas vagos e inespecíficos foram agrupados em uma “doença inventada”, a “fadiga adrenal”. Contudo, não há até o momento qualquer evidência de que a “fadiga adrenal” exista como patologia. A Endocrine Society, uma das mais respeitadas organizações médicas do mundo, posicionou-se sobre o assunto recentemente:
“A fadiga adrenal não é uma condição médica real. Não existem fatos científicos para suportar a teoria que estresse físico, mental ou emocional esgotem as glândulas adrenais e causem sintomas.”


Palavras inequívocas! Mas a medicina baseada em evidências é ainda mais categórica em refutar uma doença falsa...
As adrenais são um par de glândulas localizadas uma sobre cada rim e produzem diversos hormônios, entre eles os hormônios do estresse adrenalina, noradrenalina e cortisol. Será que estas glândulas podem cansar se estimuladas em excesso? Mesmo na ausência de qualquer fato científico, o naturopata James Wilson cunhou o termo “fadiga adrenal” em um livro publicado em 1998. Dê uma olhada no questionário de Wilson abaixo. Você apresenta algum destes sintomas?
1- Cansado sem razão aparente.
2- Dificuldade em acordar de manhã.
3- Necessidade de café, refrigerantes tipo cola, doces ou salgadinhos para ter energia.
4- Sentindo-se para baixo ou estressado.
5- Fissurado em doces ou salgadinhos.
6- Lutando para manter as tarefas de rotina.
7- Não consegue se desenvencilhar do estresse e da doença.
8- Não se diverte.
9- Não tem vontade em manter relações sexuais.
Segundo Wilson, se você convive com qualquer um desses sintomas, você tem “fadiga adrenal”, a “doença falsa” mais prevalente no mundo, já que dificilmente alguém já não apresentou algum desses sintomas.
Porém, este questionário jamais foi validado, não existem provas nem literatura pertinente que possam embasá-lo. Uma busca detalhada na base de estudos médicos Pubmed com os termos “adrenal” AND “fatigue” retorna apenas um resultado relevante, que é uma revisão que não cita as fontes revisadas!
Doenças falsas são agrupamentos de diferentes sintomas dentro de condições sem nenhum embasamento científico. É da natureza do ser humano querer entender os padrões das doenças para propor tratamentos. Porém, definir um simples grupo de sintomas é o primeiro erro nesse processo de compreensão. Isto porque os sintomas precisam ser organizados de uma maneira racional para fazerem sentido dentro de uma síndrome clínica. No caso da “fadiga adrenal”, não existe esta explicação racional da progressão e gravidade dos diferentes sintomas, apenas um agrupamento simples. O segundo grande erro é usar uma lista desorganizada de sintomas para identificar pacientes com a doença. O terceiro erro é usar testes laboratoriais em sangue ou saliva, com suas diversas complicações metodológicas, para diagnosticar uma patologia que não é ao menos descrita de forma apropriada. Por fim, o pior de todos os erros é propor tratamento, seja ele qual for, para algo pobremente definido. Como saber se algo tão “amorfo” está melhorando ou piorando com um tratamento? Como saber se o próprio tratamento não está fazendo mal?
Enquanto a “fadiga adrenal” não existe, os sintomas que muitas pessoas apresentam são sim reais. Estes mesmos sintomas podem ser causados por doenças verdadeiras como apneia do sono, hipotireoidismo, diabetes, depressão, anemia, insuficiência adrenal, neoplasias, entre outras. Ao aceitar o diagnóstico de uma “doença falsa” perde-se tempo em realizar o diagnóstico correto de algo que pode ser potencialmente grave. Por fim, pode ser frustrante apresentar sintomas e após uma avaliação médica pormenorizada não se identificar uma causa. Mas esta situação é melhor do que ter a distração de tratar uma condição fictícia.


Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576

domingo, 1 de novembro de 2015

A verdade sobre os óleos: comentário da matéria da revista Saúde É Vital (10/2015)

Em meio a tanta desinformação, eis que surge na grande imprensa uma ótima reportagem mostrando os prós e contras das principais opções de óleos vegetais disponíveis no mercado brasileiro. Sugiro fortemente a leitura da matéria na íntegra. A seguir, alguns “pontos altos” da reportagem...




1- Existe sim uma planta chamada canola e seu óleo não é tóxico. A canola é derivada do melhoramento genético de uma outra planta, a colza. Esta modificação foi feita para que o ácido erúcico da colza fosse eliminado, pois é tóxico. O óleo de canola é aprovado por diversos órgãos internacionais e não há evidência de que seu consumo, quando feito de maneira apropriada, faça mal a saúde humana.

2- A revista Saúde É Vital entrevistou uma das orientadoras do tão citado trabalho em que o consumo diário de óleo de coco reduziu a circunferência abdominal de participantes com doença cardíaca. A nutricionista Annie Bello disse a revista: “O problema (do estudo) é que o colesterol ruim, o LDL, também aumentou. Não é que esse óleo seja ruim, mas também não faz milagres. Pode inclusive acarretar prejuízos.” Sensatez de uma pesquisadora séria!

3- Os óleos de milho e girassol possuem um teor mais elevado de ômega 6 que de ômega 3. Alguns estudos sugerem que este desequilíbrio dos ômegas possa predispor a inflamação dos vasos sanguíneos. Até que mais dados estejam disponíveis, vale a moderação.

4- O óleo de soja apresenta um ótimo custo-benefício, pois é barato e tem teores equilibrados dos ômegas.

5- O fato da gordura saturada ser menos vulnerável à oxidação não é sinal de que seja melhor para a saúde. Isso só quer dizer que o óleo aguenta temperaturas altíssimas e pode ser usado repetidas vezes sem alterar seu sabor ou cheiro.

6- O azeite de oliva pode sim ser aquecido. Este óleo além de ser rico em gordura monoinsaturada, apresenta polifenóis, que são substâncias antioxidantes. A temperatura alta degrada os polifenóis, mas não torna o azeite de oliva impróprio para o consumo. Apenas perde parte do seu benefício.

Vale a leitura!

Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Consumo de café e diabetes mellitus

A cafeína é sem dúvida o estimulante mais consumido no mundo. O café, além de melhorar o estado de alerta e certos parâmetros cognitivos, está associado a uma menor incidência de diabetes mellitus tipo 2. Vamos entender como isso funciona e como podemos nos beneficiar deste potencial preventivo.



Apesar de alguns estudos de curta duração sugerirem que a cafeína possa induzir resistência insulínica, isto é, dificultar que a insulina exerça sua função de facilitar a entrada da glicose (açúcar do sangue) nas nossas células, estudos de longa duração mostram exatamente o contrário. O consumo regular tanto de café quando de chá verde/preto ajuda a insulina produzida pelo pâncreas a funcionar melhor e isto leva à redução dos níveis de glicemia após as refeições e à prevenção do diabetes. Ainda não se sabe qual o mecanismo exato por trás deste benefício, mas existem fortes candidatos:
- o consumo de café cafeinado está associado ao aumento dos níveis de adiponectina, hormônio que sabidamente reduz a resistência insulínica.
- o café cafeinado também está associado ao aumento da globulina ligadora dos hormônios sexuais, o que pode ser capaz de modular efeitos biológicos da testosterona e do estradiol nos tecidos periféricos que captam a glicose.
- a cafeína é capaz de ativar o transporte de glicose para dentro das fibras musculares independentemente da insulina, efeito similar ao do exercício.
- o consumo prologado da cafeína, em modelos animais, pode modular a sinalização através do IGF-1 aumentando a sensibilidade à insulina.
Independentemente do mecanismo, diferentes estudos já apontaram diminuição do risco de diabetes mellitus tipo 2 com o consumo do café.  O maior deles trata-se de uma revisão sistemática que compilou dados de 9 estudos e avaliou o efeito do consumo de café em quase 200 mil pessoas nos Estados Unidos, Europa e Ásia. Neste estudo, foi observada uma redução no risco de diabetes de até 35 porcento. O consumo de 2 xícaras por dia  já se mostrou benéfico, e quanto maior foi a ingesta (até 6 xícaras)  menor foi a incidência de diabetes. No entanto, como trata-se da análise de estudos observacionais, a relação causa-efeito não pode ser provada apesar dos fortes indícios. Logo, o consumo de café como estratégia para prevenção do diabetes não é formalmente recomendada.
No entanto, apesar de não serem definitivas, as evidências pesam sim a favor do café como potencial aliado contra o diabetes. Mas como se beneficiar deste possível efeito protetor? A dose de até 400 mg de cafeína por dia, que equivale a duas xícaras, é bem tolerada pela maioria dos adultos. Contudo, pessoas com enxaqueca, ansiedade, tremores, insônia ou arritmias podem piorar da sintomatologia mesmo ingerindo pequenas quantidades da bebida. Ou seja, consuma moderadamente e na dúvida consulte seu endocrinologista.

Fonte: Dam RM, Hu FB. Coffee consumption and risk of type 2 diabetes: a systematic review. JAMA. 2005;294(1):97

Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Endocrinologia: uma especialidade de doenças prevalentes

O médico especialista em hormônios e no metabolismo

Todos sabem que o cardiologista cuida do coração, que o ginecologista cuida da saúde das mulheres e que o pediatra trata de crianças. Contudo, apesar de ser uma especialidade em franca ascensão, alguém, volta e meia, sempre pergunta: “O que faz o endocrinologista?”.
Endocrinologista é o médico especialista nos transtornos das glândulas endócrinas. Diferentemente das glândulas exócrinas, que secretam substâncias nas cavidades internas ou para o exterior do corpo, as glândulas endócrinas são responsáveis por secretar substâncias na corrente sanguínea. Essas substâncias são chamadas de hormônios.




Para que servem os hormônios?

Os hormônios são responsáveis por uma série de funções fundamentais para o nosso organismo. Entre estas funções estão a regulação do metabolismo, da reprodução, do crescimento e do desenvolvimento.


Quais são as principais doenças hormonais?

Distúrbios da secreção ou da ação dos hormônios podem levar a uma série de doenças. Entre elas, as mais comumente tratadas pelo endocrinologista são:


Por que tanta gente precisa do endocrinologista?

Os hábitos de vida modernos, caracterizados por alimentação inapropriada e sedentarismo, assim como o aumento da expectativa de vida, são os responsáveis pelos níveis epidêmicos de algumas destas doenças. Por exemplo, de cada 100 brasileiros, estima-se que em torno de 40 estejam acima do peso, 10 estejam obesos e 12 estejam diabéticos. Já o hipotireoidismo (diminuição da produção de hormônios pela glândula tireoide) pode acometer cerca de 10 em cada 100 pessoas.
Uma vez que o médico endocrinologista está sendo cada vez mais requisitado, é importante que todos conheçam a abrangência da Endocrinologia como especialidade. Isso fará com que a população saiba procurar por este profissional quando necessário, garantindo assim tratamento qualificado para os problemas em questão.

No vídeo, explico um pouco mais sobre a Endocrinologia.



Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista titulado pela SBEM
Doutor e Mestre em Endocrinologia pela UFRGS
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

Conteúdo revisado em 26 de abril de 2020.

terça-feira, 13 de outubro de 2015

Fatores de risco endocrinometabólicos do câncer de mama

Globalmente, o câncer de mama é a malignidade mais frequentemente diagnosticada e a principal causa de mortes por câncer em mulheres. Cerca de 50% dos casos de câncer de mama podem ser explicados por fatores de risco conhecidos. Estes por sua vez, podem ser modificados por mudanças socioambientais ou no estilo de vida. Discutiremos aqui os fatores de risco hormonais e metabólicos.


Algumas pessoas não sabem, mas o câncer de mama também pode acometer homens. Mas por quê a doença maligna da mama é 100 vezes mais frequente em mulheres? Devido ao efeito dos estrógenos, hormônios produzidos pelo ovário. O estradiol, o principal estrógeno, exerce efeito proliferativo sobre a mama e isto, por si só, já explica grande parte desse aumento de risco. Mulheres que tiveram a primeira menstruação cedo e a última tarde, acabam tendo uma exposição maior ao estradiol, com consequente aumento do risco de câncer. Os estrógenos fornecidos por via oral, em terapias de reposição hormonal, também podem aumentar o risco, devendo ser indicados com cautela. Isso quer dizer que a mulher deve procurar baixar seus níveis de estrógenos? Não. Isso seria antifisiológico. Essas informações servem para justificar e individualizar os programas de rastreamento de câncer de mama. Conhecendo a paciente, melhoramos a conduta médica.
Outros hormônios que podem estar associados ao aumento de risco são a testosterona e a insulina. Contudo, mais estudos são necessários para que se possa estimar melhor o efeito destes.
O principal fator de risco metabólico para o câncer de mama é o excesso de peso. O aumento do risco fica em torno de 20% e é explicado pelo aumento da produção de estradiol nas células gordurosas a partir de precursores estrogênicos. Além disso, o excesso de peso causa resistência a insulina, com consequente aumento deste hormônio, que como dito anteriormente, também é suspeito de causar malignidade na mama.
O tipo de alimentação ainda gera debate. Apesar de ainda inconclusivos, alguns estudos sugerem que o consumo de uma dieta rica em gordura e carne vermelha e pobre em vegetais e derivados da soja, possa aumentar o risco de câncer de mama.
Do ponto de vista prático, o endocrinologista pode ajudar a diminuir a incidência de câncer de mama, ajudando suas pacientes a perderem peso através de uma alimentação saudável e incentivando a prática de atividades físicas. Além disso, a tão falada terapia de reposição hormonal, deve ser prescrita de maneira criteriosa e não para toda mulher após a menopausa.


Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576

domingo, 20 de setembro de 2015

Cistos de tireoide: avaliação e tratamento

Cistos ou nódulos císticos de tireoide são lesões parcial ou completamente preenchidas por fluido. São muito frequentes, podendo corresponder à metade dos nódulos tireoidianos. A maioria é assintomática e descoberta ao acaso, mas sintomas como dor ou sensação de aperto no pescoço podem ocorrer dependendo do tamanho da lesão.
De acordo com as células que os constituem, os nódulos císticos podem ser benignos (adenoma) ou malignos (carcinoma, isto é, câncer de tireoide). Felizmente, a grande maioria destas lesões é benigna. Estima-se que apenas 2 de cada 100 nódulos císticos sejam malignos. Além disso, as lesões com um componente cístico maior, isto é, com mais fluido do que células, têm um risco menor de serem malignas.

Ecografia de tireoide mostrando nódulo cístico

Na avaliação dos nódulos císticos de tireoide são fundamentais: a história clínica do paciente, a dosagem do TSH, a ecografia e a punção aspirativa com agulha fina (PAAF). Cistos simples só precisam ser puncionados se houver necessidade de drenagem, pois são virtualmente sempre benignos. Nódulos císticos com componente sólido devem ser puncionados quando maiores que 1,0-2,0 centímetros de diâmetro, dependendo de suas características à ecografia, para afastar o diagnóstico de câncer. Por exemplo, se o componente sólido for hipoecoico e com microcalcificações, o nódulo cístico precisará ser puncionado se tiver mais de 1 centímetro. Se o nódulo tiver aspecto esponjoso, só precisará ser puncionado se for maior que 2 centímetros.
O tratamento dos nódulos císticos de tireoide depende do resultado da PAAF. Lesões malignas devem ser retiradas através de cirurgia. Lesões benignas podem ter seu conteúdo líquido aspirado, serem operadas ou simplesmente observadas. Existe ainda a possibilidade de injeção de álcool dentro do cisto após a aspiração do fluido, especialmente quando o volume for grande ou se houve recidiva após uma primeira drenagem.
Se você tem qualquer lesão na tireoide, seja ela cística ou não, procure um endocrinologista para avaliação diagnóstica e terapêutica.


Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576

domingo, 13 de setembro de 2015

Saiba quando desconfiar de baixa estatura

O que é baixa estatura?

Uma criança ou adolescente é considerada com baixa estatura quando está dois desvios-padrões abaixo da média idade e sexo, ou seja, quando fica fora dos canais de crescimento nos gráficos. Mais importante do que um medida isolada da estatura, são as medidas consecutivas, que dão informação sobre a velocidade de crescimento. O acompanhamento regular com o pediatra é fundamental para identificar quem necessita de avaliação complementar. Outra maneira de desconfiar de baixa estatura é observando se a criança tem a mesma altura que as outras da mesma idade, embora a avaliação através dos gráficos de crescimento seja muito mais apropriada.


Quais as causas de baixa estatura?

Existem diversas causas de baixa estatura. Estas vão desde doenças genéticas, doenças crônicas (anemia, asma, doenças renais e cardíacas, entre outras), problemas emocionais, doenças esqueléticas e doenças endocrinológicas (raquitismo, diabetes mellitus mal controlado, deficiência do hormônio do crescimento, hipotireoidismo, doenças da adrenal e distúrbios da puberdade).

Como é feita a avaliação da baixa estatura?

A avaliação é feita através da história detalhada desde o nascimento. São feitos questionamentos sobre medicamentos em uso, presença de doenças e desenvolvimento sexual. É importante, se possível, que ambos os pais compareçam a consulta, pois deverão ser medidos para calcular a altura alvo da criança. Dependendo da avaliação clínica inicial, podem ser pedidos exames gerais, além de raio-x da mão para avaliação da cartilagem de crescimento. Conforme os resultados dessa primeira leva de exames, podem ser necessários testes específicos para confirmação dos diferentes diagnósticos.

Como é feito o tratamento da baixa estatura?

O tratamento depende da causa, sendo que para algumas condições não existe tratamento específico. Por exemplo, na criança com hipotireoidismo, se repõe o hormônio tireoidiano; já na criança com diabetes, trata-se a doença apropriadamente.
Ao contrário do que se pensa, o hormônio do crescimento não está indicado para todas as crianças com problemas de crescimento e sim para aquelas com deficiência comprovada ou em grupos selecionados, como meninas com síndrome de Turner ou crianças com insuficiência renal crônica. O tratamento é mantido até o final do crescimento e em alguns casos indefinidamente.
Nas crianças que precisam de tratamento específico, quanto antes este for iniciado, melhores serão os resultados. Logo, quando se identifica ou se desconfia de problemas no crescimento, a avaliação deve ser imediata. Retardar a consulta, esperando que seu filho(a) vá crescer depois, pode trazer prejuízos irreparáveis a estatura final.

Se você ou o pediatra percebeu ou desconfia que seu filho(a) possa estar crescendo menos que o esperado, procure um endocrinologista.

Referência:
1- Rogol AD. Diagnostic approach to children and adolescents with short stature. UpToDate.

Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista
Doutor e Mestre em Endocrinologia - UFRGS
CREMERS 30.576 - RQE 22.991
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Texto atualizado em 7 de abril de 2019.

domingo, 6 de setembro de 2015

Osteoporose: entenda e evite fraturas

O que é osteoporose?

Osteoporose é uma doença que deixa os ossos mais fracos, o que aumenta o risco de fraturas. Algumas vezes, uma simples queda da própria altura dentro de casa é suficiente para que o osso acometido pela osteoporose quebre.



Como se faz o diagnóstico de osteoporose?

A osteoporose não causa sintomas até que o osso quebre. Logo, a DENSITOMETRIA ÓSSEA, um tipo especial de raio-x, é necessária para fazer o diagnóstico. A densitometria óssea é recomendada para mulheres após os 65 anos e para homens após os 70 anos. Conforme avaliação médica, o exame também pode ser solicitado para pacientes com idade menor que 65 anos, que tenham fatores de risco, ou seja, condições que aumentem a chance de se ter osteoporose.

Os fatores de risco para osteoporose são:
- tabagismo;
- uso de corticoides;
- baixo peso;
- artrite reumatoide;
- história de fraturas prévias após pequenos traumas (queda da própria altura, por exemplo);
- abuso de álcool;
- doenças como diabetes mellitus, hipertireoidismo, hiperparatireoidismo, falência ovariana precoce (antigamente chamada de menopausa precoce), doenças que causam má absorção dos nutrientes no intestino e doenças do fígado.

Como se previne a osteoporose?

Ajudam a prevenir a osteoporose:
- comer alimentos ricos em cálcio como leite e derivados;
- comer alimentos ricos em vitamina D como leites fortificados e salmão;
- tomar sol moderadamente;
- fazer atividade física pelo menos 30 minutos por dia;
- não fumar;
- não beber em excesso.

Como se trata a osteoporose?

A osteoporose é tratada com uma ingestão adequada de cálcio e vitamina D e com remédios que ajudam a fortalecer o osso, chamados bisfosfonatos. Algumas vezes a osteoporose é causada por outra doença. Nestes casos, o tratamento é voltado primeiramente para esta causa.
O tratamento é avaliado em intervalos regulares de 1 a 3 anos através da densitometria óssea. Em alguns casos também podem ser pedidos exames de sangue e de urina.

Se você é mulher com mais de 65 anos, homem com mais de 70 anos ou possui fatores de risco para osteoporose, procure seu endocrinologista e faça uma avaliação.

Referência:
1- Yu EW. Screening for osteoporosis. UpToDate.

Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista
Doutor e Mestre em Endocrinologia - UFRGS
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

Texto revisado em 17 de fevereiro de 2019.

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

De onde vêm os nódulos de tireoide?

Nódulos de tireoide são frequentes. Dependendo da população estudada, a prevalência deste problema pode chegar a 75 por cento! Após os 40 anos de idade, pelo menos uma em cada dez pessoas terá um nódulo tireoidiano. Apesar de serem comuns, os nódulos de tireoide acabam gerando apreensão, já que cerca de cinco por cento são malignos.
Grande parte dos pacientes com nódulos de tireoide faz a pergunta: "De onde veio este nódulo? Por que ele apareceu?". Apesar do grande avanço científico, esta pergunta não é tão simples de ser respondida...



Grande parte dos nódulos de tireoide, sejam eles benignos ou malignos, é causada por mutações em genes específicos. Por exemplo, pacientes com bócios multinodulares geralmente possuem nódulos coloides. Este tipo de nódulo é formado por clones celulares, ou seja, por uma população de células derivada de uma única ou de poucas células que se dividiram em um ritmo e um padrão diferente do restante da glândula  tireoide, levando à formação do tecido em formato de caroço, que chamamos de nódulo.
Muitas mutações genéticas que levam a esta proliferação celular desordenada já foram identificadas. No entanto, as causas exatas de cada mutação ainda estão sendo investigadas.
Apesar dos fatores desencadeadores da formação dos nódulos ainda não terem sido completamente identificados, existem alguns "suspeitos". Estão associados à presença de nódulos ou de bócio:
- tabagismo, especialmente em áreas deficientes de iodo.
- consumo regular de álcool, principalmente em mulheres.
- aumento da idade. Como dito anteriormente, pessoas mais idosas tendem a desenvolver mais nódulos.
- história de radioterapia ou transplante de medula óssea.
- níveis elevados de IGF-1, hormônio produzido no fígado através do qual o hormônio do crescimento atua nos diferentes tecidos.
- mulheres com miomas uterinos têm uma incidência maior de nódulos de tireoide.
Por outro lado, também existem fatores associados a uma menor ocorrência de nódulos. São eles:
- uso de pílula anticoncepcional.
- uso de estatinas (medicamento para redução do colesterol).
Por que cada um destes fatores favorece ou dificulta o surgimento das mutações genéticas que levam a multiplicação celular desorganizada e, consequentemente, aos nódulos, ainda é tema de estudos...
Apesar de não existirem recomendações específicas para prevenção de nódulos de tireoide, não custa abandonar o fumo e não abusar de bebidas alcoólicas, já que esses dois hábitos podem causar outros abalos à saúde. Fica a dica!
Fonte: UpToDate

Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576

domingo, 30 de agosto de 2015

Retinopatia diabética: aprenda a manter a visão saudável

O que é retinopatia diabética?

Retinopatia diabética é uma condição que ataca os olhos das pessoas com diabetes mellitus, mais especificamente a retina. A retina é a camada mais interna do olho e é responsável por transformar as imagens que enxergamos em impulsos elétricos que são levados ao nosso cérebro.
A retinopatia diabética é uma das principais causas de perda de visão e cegueira. Quanto mais altos os níveis de glicose (açúcar no sangue), maior a chance de desenvolver lesões na retina.

Achados patológicos encontrados na retinopatia diabética

Quais os sintomas da retinopatia diabética?

A grande maioria das pessoas com retinopatia diabética não apresenta sintomas até que a doença esteja muito avançada. E nestes casos, geralmente, é tarde demais para tentar salvar a visão.
São sintomas de retinopatia diabética avançada:
- visão borrada;
- pontos escuros ou flutuantes;
- dificuldade em focar objetos;
- dificuldade em diferenciar as cores.

Como é feito o rastreamento da retinopatia diabética?

O rastreamento é feito pelo médico oftalmologista através do exame do fundo do olho. Este exame pode ser feito de duas maneiras:
- exame do olho dilatado: o médico pinga um colírio que dilata a pupila e examina diretamente a retina com um aparelho chamado oftalmoscópio.
- imagem digital da retina: são tiradas fotos da retina dos dois olhos através de uma câmera especial. Estas fotos são então avaliadas pelo médico.

Quando começar o rastreamento?

Depende do tipo de diabetes. Nas pessoas com diabetes mellitus tipo 2, independente da idade, o rastreamento começa no momento do diagnóstico. Já nas pessoas com diabetes mellitus tipo 1, o rastreamento começa 3 a 5 anos após o diagnóstico. Crianças com diabetes mellitus tipo 1 devem começar o rastreamento a partir dos 10 anos de idade, se forem diabéticas a pelo menos 3 ou 5 anos. Após iniciado, o rastreamento passa a ser feito a cada 12-24 meses.

Como é o tratamento da retinopatia diabética?

O melhor tratamento é a prevenção. Dá pra prevenir a retinopatia diabética mantendo controlados os níveis de glicose e de pressão arterial. Contudo, quando existe risco de perda de visão, o tratamento é feito com laser ou com cirurgia no olho, dependendo do caso.

Se você é diabético(a), mantenha acompanhamento regular com seu endocrinologista. Glicose e pressão arterial precisam estar sempre bem controladas. Além disso, consulte regularmente com o oftalmologista.

Referência:
1- Fraser CE. Diabetic retinopathy: Prevention and treatment. UpToDate.

Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista titulado pela SBEM
Doutor e Mestre em Endocrinologia pela UFRGS
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

Texto atualizado em 3 de fevereiro de 2019.

terça-feira, 25 de agosto de 2015

Hirsutismo: crescimento excessivo de pelos em mulheres

O que é hirsutismo?

Chamamos de hirsutismo o crescimento excessivo de pelos grossos e escuros em áreas do corpo onde apenas os homens deveriam tê-los. Essas áreas são:
- lábio superior (região do bigode);
- queixo;
- área das costeletas;
- peito e ao redor dos mamilos;
- barriga;
- costas;
- coxas.
É uma condição muito comum, afetando 1 em cada 10 mulheres antes da menopausa (última menstruação).


Quais são as causas do hirsutismo?

Muitas mulheres têm hirsutismo devido a sua genética, ou seja, possuem mães ou irmãs também com excesso de pelos. Outras têm hirsutismo devido a altos níveis de hormônios masculinos no sangue, os androgênios.
A principal condição que leva ao aumento dos androgênios e hirsutismo é a síndrome dos ovários policísticos (SOP). Contudo, existem outras causas menos frequentes como tumores de ovário e doenças das glândulas adrenais.

Que outros sinais/sintomas podem estar associados ao hirsutismo?

Nas mulheres com SOP, além do hirsutismo pode haver:
- alterações menstruais;
- queda de cabelo;
- acne;
Quando os androgênios estão muito elevados, pode ocorrer virilização, ou seja, aumento da massa muscular, mudança do timbre da voz e calvície. Nesses casos, a avaliação deve ser rápida, pois os sintomas podem ser causados por um tumor.

Que exames são necessários na avaliação do hirsutismo?

Dependendo do caso, os seguintes exames podem ser solicitados:
- exames de sangue para dosagem dos androgênios;
- em alguns casos selecionados, exames de imagem da adrenal e testes hormonais.

Como é feito o tratamento do hirsutismo?

Dependendo da causa, o hirsutismo pode ser tratado com:
- remédios chamados anti-androgênios, que diminuem os níveis ou bloqueiam a ação dos androgênios
- medidas locais como depilação convencional com lâmina ou cera, ou definitiva com laser ou eletrólise.

Se você se sente incomodada com o excesso de pelos, procure o endocrinologista e faça uma avaliação para identificar a causa e receber o tratamento apropriado.

Referência:
1- Barbieri RL. Patient education: Hirsutism (excess hair growth in women) (Beyond the Basics). UpToDate.

Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista titulado pela SBEM
Doutor e Mestre em Endocrinologia pela UFRGS
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

Texto revisando em 20 de janeiro de 2019.

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Hemoglobina glicada e sua importância no seguimento do paciente diabético

O que é hemoglobina glicada?

Hemoglobina glicada ou hemoglobina A1C é um exame de sangue que mostra a média da glicose nos últimos 2 ou 3 meses.
É um exame importante por dois motivos:
- serve para ajudar a diagnosticar o diabetes mellitus;
- no paciente que já tem o diagnóstico, serve para saber se o tratamento está adequado.


Quais os valores normais da hemoglobina glicada?

Nos pacientes que ainda não tem diagnóstico de diabetes, valores de hemoglobina glicada maiores ou iguais a 6,5% sugerem que este paciente possa ter a doença. Logo, deve-se repetir o exame para confirmar o diagnóstico.
Nos pacientes que já são diabéticos, a hemoglobina glicada deve estar em torno de 7% ou menos. Estes valores querem dizer que a glicose no sangue está bem controlada e o tratamento está sendo feito corretamente.


Com que frequência o exame deve ser feito?

Se os valores da hemoglobina glicada estiverem abaixo de 7%, o tratamento está adequado, logo o exame poderá ser repetido a cada 4 ou 6 meses, dependendo do caso. Mas se os valores estiverem acima de 7%, o tratamento deve ser revisado e ajustado, e o exame repetido em 2 ou 3 meses.

Qual a importância da hemoglobina glicada?

Várias pesquisas científicas mostram que manter a hemoglobina glicada dentro da normalidade ajuda evitar complicações do diabetes como:
- problemas na retina que podem levar a cegueira;
- doenças nos nervos;
- doença renal e hemodiálise;
- doenças vasculares com infarto do miocárdico e acidente vascular encefálico (isquemia).

Se você é diabético, mantenha acompanhamento regular com seu endocrinologista e procure fazer o tratamento da melhor maneira possível para manter a hemoglobina glicada o mais próximo possível do normal.

Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista
Doutor e Mestre em Endocrinologia pela UFRGS
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

Texto revisado em 20 de janeiro de 2019.

domingo, 16 de agosto de 2015

Hipertireoidismo: quando desconfiar se a tireoide está funcionando demais?

HIPERtireoidismo é como se chama a doença em que a glândula tireoide produz hormônios em excesso. É diferente de HIPOtireoidismo. Nesta última há uma diminuição na produção de hormônios.

O que é tireoide?

A tireoide é a glândula localizada na região anterior do pescoço, logo abaixo do pomo-de-adão. É responsável pela produção de hormônios (T4 e T3) que regulam a maneira como nosso corpo usa a energia, ou seja, nosso metabolismo.
A tireoide, por sua vez, é controlada pela glândula hipófise, localizada na base do cérebro, através de um terceiro hormônio chamado TSH.


Quais as causas de hipertireoidismo?

A principal causa de hipertireoidismo é a condição chamada de doença de Graves (se pronuncia "greives"). Na doença de Graves, a tireoide é atacada por anticorpos que a estimulam a produzir T4 e T3 em excesso. É mais comum em mulheres, mas também pode acometer homens. Os pacientes com doença de Graves podem desenvolver, além dos sintomas de hipertireoidismo e aumento da tireoide, doença nos olhos, principalmente se fumarem. Chamamos esta doença dos olhos de orbitopatia de Graves.
Outras causas de hipertireoidismo são:
- nódulos de tireoide tóxicos, ou seja, nódulos que produzem hormônio em excesso;
- tireoidites (inflamação da tireoide). Em alguns casos, essa inflamação é acompanhada por dor na localização da tireoide;
- ingestão de hormônio tireoidiano em excesso.
Obs: nas duas últimas situações o termo semiologicamente mais apropriado é tireotoxicose ao invés de hipertireoidismo.

Quais os sintomas do hipertireoidismo?

As pessoas com hipertireoidismo geralmente têm sintomas como:
- fraqueza, especialmente nos braços e coxas, o que torna difícil a subida de escadas;
- tremores finos, especialmente das mãos;
- aumento da produção de suor e intolerância ao calor;
- cansaço;
- perda de peso apesar do apetite normal ou aumentado.

Como é feito o diagnóstico?

O diagnóstico é simples e feito através da dosagem dos hormônios (TSH, T4 e T3) no sangue. Para determinar a causa do hipertireoidismo, algumas vezes são necessários exames complementares como ecografia e cintilografia de tireoide.

Como é feito o tratamento?

O tratamento depende da causa do hipertireoidismo e pode ser feito com medicamentos, iodo radioativo ou cirurgia.
Caso você apresente sintomas e desconfie que possa estar com hipertireoidismo, procure o endocrinologista para avaliação e tratamento adequados.

Fonte:

1- Ross DS. Overview of the clinical manifestations of hyperthyroidism in adults. UpToDate.


No vídeo, explico as principais diferenças entre HIPERTIREOIDISMO e HIPOTIREOIDISMO.


Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista titulado pela SBEM
CREMERS 30.576 - RQE 22.991
facebook.com/drmateusendocrino

Texto atualizado em 13 de janeiro de 2019.

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

DHEA e envelhecimento

A dehidroepiandrosterona (DHEA) e sua forma sulfatada, o sulfato de dehidroepiandrosterona (SDHEA), são produzidos pelas glândulas adrenais, que estão localizadas acima de cada um dos rins. O DHEA é considerado um androgênio fraco, isto é, um hormônio que precisa ser convertido em formas mais ativas para exercer suas funções biológicas. A produção do DHEA atinge seu pico por volta do 25 anos. À medida que envelhecemos, sua produção diminui. Por volta dos 80 anos, a concentração de DHEA é cerca de 80 por cento menor.
Pequenas quantidades do DHEA e do SDHEA são convertidas em androgênios mais ativos (androstenediona, androstenediol, testosterona e 5-dihidrotestosterona) ou mesmo em estrogênios (estradiol e estrona) nas glândulas adrenais, nos folículos pilosos (locais onde crescem os pelos), próstata, órgãos genitais e no tecido adiposo (gordura). Estes hormônios mais ativos interagem com os receptores celulares e não o DHEA propriamente dito. Nas mulheres, DHEA e SDHEA são fontes importantes de efeito androgênico, o que não acontece nos homens.



O interesse em suplementar DHEA é crescente. Vários efeitos benéficos têm sido defendidos, como ação vasodilatadora, anti-depressiva, anti-inflamatória, anti-aterosclerótica e mesmo anti-envelhecimento. Mas será o DHEA a tão procurada "fonte da juventude"?
Em pacientes com insuficiência adrenal, doença caracterizada pela redução na produção de corticoides, o uso do DHEA pode ser útil. Diferentes estudos mostram que o uso de doses entre 50 e 200 mg por dia podem melhorar o bem estar e sintomas psicológicos. Alguns destes estudos também evidenciaram, de forma menos consistente, melhora na função sexual, massa óssea e massa magra. Vale lembrar que estes efeitos benéficos foram observados em pessoas com doença adrenal grave e não na redução hormonal relacionada à idade.
Quando utilizado como estratégia "anti-aging", o DHEA não mostra resultados tão animadores. Ensaios clínicos randomizados têm resultados conflitantes com relação ao bem estar, sendo que a maioria dos estudos não consegue demonstrar esse efeito. Com relação ao aumento de massa magra, os estudos são categóricos em afirmar que o uso do DHEA para esta finalidade não funciona. Apesar de estudos em animais evidenciarem redução de gordura abdominal, a maioria dos estudos com seres humanos não evidenciou este efeito. Outras propriedades não observadas foram  prevenção da perda de memória e prevenção de doenças cardiovasculares.  Por fim, o uso de DHEA pode aumentar a densidade mineral óssea, principalmente no fêmur. Contudo, se esta melhora no tecido ósseo se traduz em prevenção de fraturas, ainda não se sabe.
O uso do DHEA não é isento de efeitos adversos. Aumento da oleosidade da pele, crescimento excessivo de pelos, redução do colesterol HDL ("colesterol bom"), palpitações e surtos maníacos podem acontecer, já que estamos falando de um hormônio androgênico. Outro problema é com relação a sua pureza. Como o DHEA é importado e nos Estados Unidos, é considerado um suplemento alimentar, muitas vezes as apresentações comerciais têm origem duvidosa e concentrações diferentes das informadas no rótulo.
Em resumo, apesar de existir a opção de reposição via oral do DHEA, este tipo de tratamento de "modulação hormonal" traz poucos ou nenhum benefício a não ser que o usuário tenha insuficiência adrenal confirmada. Além disso, os estudos que avaliaram este tipo reposição envolveram poucos participantes e não duraram mais do que 2 anos. Isto compromete muito a capacidade de generalização dos resultados principalmente no que se refere à segurança do tratamento. Logo, como podemos perceber, ainda não foi desta vez que a reposição de um hormônio foi capaz de combater o processo de envelhecimento...

Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576

sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Hormônio do crescimento e envelhecimento

No texto anterior, aprendemos que a medida que o tempo passa, nossas células envelhecem e seus tecidos perdem função. Isso acaba por levar à diminuição nos níveis de alguns hormônios, entre eles o hormônio do crescimento ou GH (do inglês growth hormone). Neste "capítulo", entenderemos um pouco mais sobre como o GH age e o que vai acontecendo à medida que os anos passam...
A glândula hipófise, que está localizada na base do cérebro logo atrás dos nossos olhos, começa a fabricar o GH desde muito cedo, quando ainda estamos dentro do ventre de nossas mães. O gene do GH está localizado no cromossomo 17 e é regulado por interações complexas. A secreção do GH pela hipófise pode ser estimulada ou inibida por diferentes fatores. O GHRH (do inglês growth hormone releasing hormone), por exemplo, é um hormônio produzido na região do cérebro chamada de hipotálamo e estimula a secreção do GH; já a somatostatina, inibe a secreção do GH. Fatores não hormonais também são importantes. A atividade física aumenta a secreção de GH e a obesidade diminui. A liberação do GH pela hipófise acontece em pulsos, isto é, durante a noite na fase de sono profundo, são liberadas grandes quantidades em intervalos pequenos. Esta informação é importante, pois uma dosagem baixa de GH não significa necessariamente que haja deficiência, mas que a coleta do exame foi feita no momento ou de forma incorretos.



Após cair na corrente sanguínea o GH viaja até o fígado onde estimula a produção do IGF-1. É através do IGF-1 que o GH promove o crescimento através da cartilagens localizadas nos ossos longos. Outras funções importantes do GH são aumento da síntese proteica, o que ajuda a formar músculos, e aumento da lipólise, isto é, aumento da queima da gordura estocada.
A medida que ficamos mais velhos, duas coisas acontecem:
1- O hipotálamo reduz progressivamente a secreção do GHRH. Além disso, a hipófise torna-se cada fez menos sensível ao hormônio hipotalâmico. Como consequência, a secreção de GH também cai.
2- Existe a tendência à inatividade com consequente ganho de peso. Como vimos anteriormente, isso também contribui para queda nos níveis do GH. Aqui temos um ponto frequentemente interpretado de maneira incorreta pelos defensores das terapias de "modulação hormonal" para combater o envelhecimento. A queda do GH é consequência da envelhecimento e de um modo de vida sedentário e não a causa! Outro fator que pode piorar a secreção do GH com a idade é a baixa qualidade do sono.
Apesar de todos os indícios apontarem que a queda dos níveis do GH são consequência e não causa do processo de envelhecimento, já foram realizados diversos estudos visando normalizar ou "modular" os níveis deste hormônio na tentativa de manter o bem estar e a juventude. No entanto, os resultados foram ora contraditórios, ora decepcionantes...
Um dos estudos mais bem desenhados sobre o assunto foi publicado na revista médica JAMAem 2002. Neste ensaio clínico randomizado, foram avaliados 131 pacientes (homens e mulheres) com mais de 65 anos. Conforme esperado, o uso do GH ajudou a aumentar a massa muscular, reduzir a massa gordurosa e a melhorar a performance atlética de maneira muito sutil. Contudo, efeitos adversos como inchaço, dores nas juntas, síndrome do túnel do carpo e diabetes foram muito frequentes, o que levou os pesquisadores do estudo a concluir que este tipo de tratamento não deve ser usado, pois os prejuízos à saúde são maiores que os benefícios.
Cinco anos após, em 2007, foi publicada na revista Annals of Internal Medicine um extensa revisão de toda a literatura médica sobre o uso do GH como tratamento "anti-aging". Esta revisão compilou os dados de 18 estudos para chegar às seguintes conclusões:
- os estudos foram curtos demais. Não duraram mais do que 6 meses. Isso limita muito a capacidade de avaliar benefícios e principalmente os possíveis riscos à saúde.
- GH não emagrece. O peso dos participantes se manteve estável. Contudo, em média, houve ganho de 2 quilos de massa magra e perda de 2 quilos de gordura.
- essa mudança na composição corporal não foi capaz de reduzir os níveis de colesterol nem de melhorar a massa óssea após os devidos ajustes às particularidades de cada paciente.
- os pacientes que fizeram uso de GH apresentaram efeitos adversos como inchaço, dores nas juntas, síndrome do túnel do carpo, glicose elevada, diabetes e ginecomastia (crescimento de mamas em homens).
Logo, o uso da terapia de "modulação hormonal" com GH oferece um ganho muito discreto às custas de efeitos adversos muito frequentes e custo elevado. Além disso, estudos com animais têm mostrado que níveis diminuídos de GH estão associados à maior longevidade, uma observação intrigante que põe em cheque a hipótese de que a reposição de hormônio do crescimento seria de fato um tratamento "anti-aging".
Infelizmente, apesar dos fatos científicos e das recomendações em contrário, algumas pessoas ainda buscam e outras ainda oferecem esta falsa "fonte da juventude"...
Fique de olho! E na sequência, conversaremos sobre outros hormônios e seus papéis no envelhecimento.

Referências:
1- Blackman MR et al. Growth hormone and sex steroid administration in healthy aged women and men: a randomized controlled trial. JAMA. 2002;288(18):2282.
2- Liu H et al. Systematic review: the safety and efficacy of growth hormone in the healthy elderly. Ann Intern Med. 2007;146(2):104.

Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576

sexta-feira, 31 de julho de 2015

O papel dos hormônios no envelhecimento

Estamos ficando mais maduros, isto é um fato! Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2010 havia 18 milhões de pessoas com 60 anos ou mais e em 2050 serão 64 milhões. O envelhecimento é um processo biológico complexo e progressivo que diminui a função das nossas células e tecidos. Consequentemente, nosso corpo torna-se menos apto à reprodução e à sobrevivência. Desde o século 19, tem-se tentado achar uma "fonte de eterna juventude" através do uso de hormônios. Apesar do processo de envelhecimento ter sido apenas parcialmente decifrado e ser decorrente de uma intrincada acumulação de defeitos bioquímicos nos ácidos nucleicos, proteínas e membranas celulares, algumas pessoas ainda insistem em vender a ideia de que uma "modulação hormonal" possa ser capaz de impedir que fiquemos velhos.  As melhores evidências disponíveis até o momento culpam os seguintes processos em fragilizar nosso organismo: estresse oxidativo causado por radicais livres; glicosilação não enzimática de proteínas com perda de suas propriedades; alterações epigenéticas como metilação do DNA e acetilação de histonas, que dificultam a renovação celular e, consequentemente, o funcionamento dos diferentes tecidos. Complicado, não? No entanto, quais substâncias ou processos bioquímicos desencadeiam ou revertem estes processo ainda são desconhecidos. Além disso, o processo é individualizado, já que pessoas com a mesma idade cronológica podem parecer mais ou menos idosas quando comparadas entre si. Ou seja, a diminuição nos níveis de alguns hormônios é mais provavelmente consequência do que causa do processo de envelhecimento.

Alterações hormonais parecem ser consequência e não causa do processo de envelhecimento

Quando avaliamos um indivíduo do ponto de vista hormonal, devemos estar cientes que alterações podem ser tanto devidas à idade quanto a doenças crônicas, muito comuns a medida que o tempo avança, mesmo que assintomáticas. Parece simples, mas na maioria das vezes esta distinção é muito difícil de ser feita, principalmente devido a falta de estudos que definam o que é "normal" para uma determinada faixa etária. De uma maneira geral, as seguintes alterações hormonais que aparecem com a idade são relevantes:
1- o único sistema hormonal em que há uma diminuição de função bem definida, abrupta e universal com o envelhecimento é no eixo hipotálamo-hipófise-ovários nas mulheres. É a famosa menopausa.
2- a produção de hormônio do crescimento, testosterona e do hormônio adrenal DHEA diminui com a idade. Existem valores de referência definidos para as diferentes faixas etárias. Contudo, se estes valores são fisiologicamente ótimos, ainda não sabemos.
3- alguns outros hormônios como o TSH, que estimula a tireoide, podem sofrer alteração com a idade. Mas estas alterações são menos previsíveis e os valores de referência são pouco definidos. Logo, qualquer alteração, deve ser cuidadosamente avaliada.
4- alguns hormônios acabam subindo ou diminuindo com a idade devido a uma diminuição ou aumento da sensibilidade dos tecidos alvos. Ou seja, trata-se apenas de um mecanismo de adaptação.
Até aqui, podemos perceber que alterações hormonais podem acontecer com o envelhecimento, mas não são necessariamente causas deste processo. Mas a "modulação hormonal" pregada por alguns adeptos da "medicina anti-aging" pode ajudar? Pode fazer mal? Veremos nos próximos capítulos...
Fonte: UpToDate OnLine

Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576